Com 21 anos ingressei na vida
militar.
Embarquei em Vendas Novas e
fui para Tavira, para o curso de Sargentos Milicianos, em setembro de
1964.
Em janeiro do ano seguinte fui
para Mafra, onde fiz a especialidade, e três meses depois fui para o RI
15 de Tomar para formar Batalhão.
A minha companhia, a 1478, foi
destacada para Moçambique. [1]
Embarcámos no navio ‘Pátria’ a
8 de outubro de 1965, com paragens em Luanda, Lourenço Marques e Beira.
Desembarcámos em Nacala a 1 de novembro, indo depois de comboio até
Catur e, finalmente, de viatura, até Vila Cabral. Aí, estacionámos uns
dias para fazer patrulhamento em redor da cidade, antes de sermos
colocados em Maniamba [2], onde
fomos ocupar umas instalações destinadas à maternidade.
Passado pouco tempo tivemos
uma baixa: um camarada perdeu a perna devido ao rebentamento de uma mina
antipessoal.
Em Maniamba, havia dois
destacamentos: no Bandece e no Gião [3].
Neste último, não havia nada. Só terra e céu. Tivemos de construir
abrigos debaixo do chão onde passámos a viver, comer e dormir. Foi aí
que sofremos vários ataques porque a Frelimo não queria que ocupássemos
a posição. Para chegar a Gião, rebentámos tantas minas que já não havia
pneus sobresselentes para as viaturas.
Quando estávamos a construir
uma nova ponte sobre o Rio Gião, morreram-nos dois camaradas: um ao
pisar uma mina quando ia buscar água ao rio; outro o enfermeiro que,
indo acudi-lo, pisou outra mina. Morreram os dois. Os corpos tiveram de
ir numa Berliet durante 60 km, porque o pessoal da Força Aérea daquela
altura se recusava a transportar os mortos. [4]
TRATADO POR UM NEGRO
Recebemos uma mensagem. Era
preciso que um grupo de combate saísse às dez da noite para o mato para
encontrar um avião que tinha andado a bombardear a zona e que se tinha
despenhado. A missão calhou ao meu pelotão. Andámos três dias à procura,
já sem rações de combate nem tabaco, com emboscadas pelo caminho. Demos
com ele, mas o piloto era cadáver. [5]
Mais tarde, eu e oito
camaradas meus fomos vítimas de uma mina colocada na estrada perto do
destacamento do Bandece. O Unimog onde seguíamos passou por cima de uma
mina, o que fez com que a viatura voasse uns 20 metros e o pessoal que
seguia lá dentro cuspido e atirado para o ar. Todos exceto o condutor,
que, por o Unimog ter capota, ficou lá dentro, só com a cabeça de fora e
a gritar para que o fôssemos buscar. Foi aí que um soldado, ao chegar ao
pé de mim, me disse que eu estava cheio de sangue na cabeça. Fomos todos
levados para o aquartelamento em Maniamba, para sermos transportados de
avioneta para Vila Cabral. Em Maniamba, estava um casal de enfermeiros
de cor, a quem presto a minha homenagem. O Sr. Ismael observou-me,
disse-me que eu tinha dois vasos cortados e perguntou-me se autorizava
que os suturasse. Disse que sim, que confiava nele, e ao chegar ao
hospital de Vila Cabral os médicos disseram-me que não teriam feito
melhor trabalho.
Passado um ano
[?!], fomos colocados
[6] em Meponda (Porto Arroio), junto ao
Lago Niassa, zona de guerrilha onde estivemos seis
[?!] meses. Seguimos [7]
para Mecubúri, com três destacamentos. Aqui estivemos até ao fim da
nossa missão, tendo regressado à metrópole no navio ‘Vera Cruz’.
Mário Freitas da Silva
Comissão: Moçambique 1965-1967
Força: Companhia de Caçadores
1478
Atualidade: Aos 72 anos, vive
em Vendas Novas. Está reformado, é casado e tem duas filhas e quatro
netos.
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Elementos cedidos por um colaborador do portal UTW:
[1]
HU no acervo do AHM sob as cotas 2/7/54M e 2/7/127
[2]
no dia 20Nov65
[3]
Rio Coloma
[4]
6ª feira 18Mar66 - Ponte Coloma: Soldado atirador CIPRIANO JOSÉ VIEIRA;
e 1ºCabo auxiliar de enfermeiro ALBANO ALMEIDA FIGUEIREDO